segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Uma Fábula da Criação

 (Esta é uma história puramente ficcional, que não tem intenção de veicular ensinamento, crença ou ideologia. Enjoy it!)
 


 





No início o Criador estava dormindo e todas as coisas repousavam no Nada. Seu semblante plácido mostrava um sono profundo e sem sonhos, enquanto Seu sangue latejava ritmicamente no corpo imóvel. Então, Ele abriu os olhos. No mesmo instante, Sua Mente Divina se lançou no vácuo na forma de poeira cósmica finíssima. Estava inaugurado o espaço-tempo, permeando cada porção do que se chamaria o Universo.
Os pensamentos do Criador voavam livremente, Suas lembranças brilhavam aqui e ali, em turbilhões de matéria. O corpo do Criador ainda jazia em repouso, enquanto Sua Consciência se espalhava e se cristalizava em um sem-número de formas. Deus imaginava, e criava e criava. Então, Ele sentiu fome. Um vazio corroeu Suas entranhas e Ele sentiu desejo de comer alguma coisa, porque, junto com a poeira cósmica, o desejo fora criado. E Deus sentiu desejo de Deus, pois Seu sexo também despertara.
Ora, quando o Criador começou a sentir desejos, a matéria enlouqueceu. Até então, lançada a esmo, ela flutuava tranquila, mas começou a sofrer um impulso generalizado de se aproximar e se aglutinar, obedecendo à necessidade imperiosa de alimentar-se e de fundir-se. Surgiu a força gravitacional e, sob o seu influxo, a poeira cósmica aglomerou-se e gerou os corpos.
De um momento para o outro, luzes se acenderam por todo o Universo como um pisca-pisca numa árvore de natal. Por toda parte nasciam as estrelas e as galáxias, os planetas e os satélites, e infinidades de seres celestes. O Universo, que surgira do Nada com os pensamentos do Criador, agora funcionava como um organismo vivo e irrequieto. Estrelas devoravam estrelas, galáxias devoravam galáxias e eram tragadas por buracos negros, planetas se fundiam e se desintegravam e assim incessantemente. A matéria criada não tinha apenas a Inteligência de Deus, agora era um organismo que possuía também a Sua inesgotável Vida.
O Criador assistia a todo esse espetáculo e não cessava de Se admirar das coisas lindas e boas que por Sua vontade haviam sido criadas. O desenrolar imprevisível daquele drama a que dera início havia feito surgir o Tempo. E o Criador acompanhava com grande interesse o desenrolar da existência de todos os seres.
Mas um dia, no meio do Tempo, o Criador vislumbrou em Si Mesmo uma tristeza. O Coração de Deus se apertou ao ver Suas criaturas mergulhadas naquela faina interminável de saciar desejos. Ele viu o quanto elas eram solitárias e sem objetivo, afastando-se cada vez mais do Centro onde foram geradas. E Nosso Senhor sentiu imensa compaixão de Suas criaturas.
No mesmo instante, do Seu Peito Divino começou a brotar uma ternura infinita que envolveu o Mundo como uma rede de matéria invisível. Muito mais tarde, algumas criaturas investigadoras começaram a desconfiar da presença dessa rede e lhe deram o nome de “matéria ou energia escura”. E a ternura divina espalhou-se e impregnou cada porção da matéria e fez com que doravante os corpos, em vez de se afastarem indefinidamente, sem rumo e sem sentido, permanecessem juntos e estáveis, para Seu deleite.
Por acaso, naquele dia em que o Criador viu nascer Sua Misericórdia, Ele estava olhando para um pequeno planeta de uma insignificante estrela na periferia de uma modesta galáxia, nos cafundós do Universo. Ele lhe deu o nome de Terra, e viu que, ao dar-lhe um nome, imediatamente estabelecia-se entre ambos um vínculo de afeto indissolúvel. E Nosso Senhor viu que isso era bom, e passou a emitir o Seu Verbo para unir-Se indissoluvelmente com Suas criaturas.
O Verbo de Deus, fecundando o planetinha, fez com que surgissem novas espécies de criaturas na superfície. Brotaram ali infinitas espécies minerais, vegetais e animais, cada qual mais complexa, alimentando-se umas das outras e recebendo as Radiações do seu Sol local. Até que, dentro da cadeia evolutiva, surgiu um novo tipo de animal-homem dotado de habilidades destacadas em todo o singular Reino Orgânico da Terra.
E o Senhor desperto, que havia criado o Universo com Sua Consciência; que o havia animado e alimentado com Sua Vida e que lhe havia dado a possibilidade de autossustentar-se com Seu Amor, acompanhou com especial interesse essa nova criatura.  Ele via com curiosidade o Homem e, especialmente, as formas que nele haviam tomado as características que lhe couberam por hereditariedade: Consciência, Vida e Amor.
O Criador acompanhou com Seu olhar todos os passos do homem. Suas lutas, seus sofrimentos, suas conquistas e vergonhas. Ele viu que em todas as coisas que o homem fazia, tais como cultivar a terra, relacionar-se, festejar, procriar, estudar ou guerrear, estavam sempre presentes as características divinas, porém, completamente deturpadas pela ignorância do bicho-homem em relação à sua própria origem. De fato, o homem estava bem longe, no Universo, do Grande Sol Central, e embora a Divina Radiação o envolvesse por completo, ele de nada suspeitava e acreditava que estava entregue a si próprio, mergulhado em sofrimento e angústia.
Então, no meio do infinito dos dias, aconteceu uma coisa que fez o Coração de Deus dar um salto em Seu Peito, abalado por forte e inesperada emoção. É que um daqueles seres insignificantes no Universo chamados Homens, em meio ao seu trabalho diário, depôs a enxada um instante, sem razão aparente e, enxugando o suor da testa olhou para o céu infinito, como quem procura alguma coisa perdida. E o Senhor Deus ouviu perfeitamente quando esse primeiro homem, em seu coração, clamou: “Pai...!”. E Deus viu que nem tudo estava perdido, afinal.
 
Márcia Kondratiuk/2016
 
 
 
 
 
 


2 comentários:

  1. Muito lindo. Vasto, amplo mas muito simples.
    Parabéns por ter conseguido colocar tudo num só texto!
    Adorei.
    Posso compartilhar no Facebook?
    Bjs

    ResponderExcluir
  2. Muito lindo. Vasto, amplo mas muito simples.
    Parabéns por ter conseguido colocar tudo num só texto!
    Adorei.
    Posso compartilhar no Facebook?
    Bjs

    ResponderExcluir